Mariana: União e ES rejeitam proposta de mineradoras para novo acordo de reparação
03/05/2024
Advocacia-Geral da União e Estado do Espírito Santo avaliaram que nova proposta não apresenta avanços com relação à anterior, discutida em dezembro do ano passado. No final de abril, mineradoras propuseram R$ 127 bilhões em reparação, sendo que R$ 37 bilhões já foram investidos. Destroços de casa atingida pela lama de rejeitos da Samarco em Bento Rodrigues, em outubro de 2023
Rafaela Mansur/ g1
A Advocacia-Geral da União (AGU) e o Estado do Espírito Santo comunicaram à Justiça Federal que rejeitaram a proposta de um novo acordo de reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na Região Central de Minas Gerais, apresentado por Vale, BHP e Samarco.
A União e o Estado do ES afirmaram que rejeitaram porque a oferta das mineradoras "não representa avanço em relação à proposta anterior, apresentada e discutida em dezembro de 2023", além de conter "condições inadmissíveis que desconsideram o que já havia sido exaustivamente debatido e acordado desde que as tratativas estão em andamento".
No final de abril, as empresas apresentaram a proposta de R$ 127 bilhões em reparação, sendo que R$ 37 bilhões já foram investidos em ações de compensação.
A oferta prevê o pagamento de R$ 72 bilhões em dinheiro, ao longo de um período não informado, aos governos federal, de Minas Gerais e do Espírito Santo e aos municípios atingidos, e R$ 18 bilhões em obrigações de fazer (realização de ações de reparação).
Os entes federal e estadual do ES avaliaram que o aumento do valor ofertado pelas empresas para financiar as medidas de reparação foi proposto junto a uma "redução drástica nas obrigações que as mineradoras já haviam concordado em assumir durante as negociações".
Já o Governo de Minas Gerais, em nota, informou que também espera uma revisão da proposta. Diferente de AGU e ES, MG afirma que a nova oferta apresenta avanços, mas que ajustes são necessários.
O comunicado da recusa pela AGU e pelo ES foi enviado nesta sexta-feira (3) ao desembargador federal Ricardo Machado Rabelo, mediador responsável pelo caso no Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6).
Em nota, a BHP informou que "sempre esteve e segue comprometida com as ações de reparação e compensação" e que "segue disposta a buscar, coletivamente, soluções que garantam uma reparação justa e integral às pessoas atingidas e ao meio ambiente".
O g1 procurou as outras mineradoras envolvidas e aguarda retorno.
O que argumentam os envolvidos
Entre as alterações feitas pelas mineradoras que motivaram a recusa da nova proposta de acordo, a AGU e o Estado de ES destacaram pontos como:
diminuição na retirada de rejeitos de mineração do Rio Doce;
transferência da obrigação de recuperação de nascentes e áreas degradadas para o poder público;
encerramento do gerenciamento de áras contaminadas;
presença de municípios considerados afetados que nunca foram reconhecidos pelo poder público;
ausência de municípios considerados afetados que já foram reconhecidos pelo poder público;
exigência de adesão formal de municípios à repactuação e desistência de outras ações anteriores movidas por estes.
A AGU e ES também informaram que o valor já investido na Fundação Renova não deveria estar incluído nesta nova proposta e que o acordo deve partir do que já foi discutido em dezembro do ano passado.
Rio Doce foi atingido pela lama da Samarco; foto de novembro de 2015
Leonardo Merçon/Instituto Últimos Refúgios
Impasse antigo
As discussões sobre um novo acordo para a reparação dos danos causados pela tragédia em Mariana já duram anos. Em dezembro de 2023, as conversas foram suspensas por causa da divergência entre o valor oferecido pelas mineradoras, de aproximadamente R$ 40 bilhões, e o montante solicitado pelo poder público, de R$ 120 bilhões.
De acordo com fontes ligadas às negociações, apesar de o valor ter aumentado em relação ao ano passado, a proposta pouco avançou, na prática, porque as obrigações de fazer foram esvaziadas – uma das principais mudanças é a redução da quantidade de rejeitos a ser retirada do Rio Doce.
Outro ponto de insatisfação do poder público é o fato de o texto isentar as empresas de responsabilidade por eventuais danos que vierem a ser verificados no futuro.
Em nota, o Movimento dos Atingidos (MAB) afirmou que "uma proposta de R$ 90 bilhões jamais resolverá o problema ou poderá ser aceita como solução ao crime".
"São quase 9 anos de espera e luta por uma reparação integral, digna e justa, e essa dívida com o povo não será quitada se não houver a participação efetiva dos atingidos".
Bombeiros procuram por vítimas de rompimento da barragem em Bento Rodrigues, em Mariana
Márcio Fernandes/Estadão Conteúdo
Relembre
A barragem de Fundão rompeu em 5 de novembro de 2015, em Mariana, e causou o maior desastre ambiental da história do país. Dezenove pessoas morreram.
Cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração destruíram comunidades e modos de sobrevivência, contaminaram o Rio Doce e afluentes e chegaram ao Oceano Atlântico, no Espírito Santo. Ao todo, 49 municípios foram atingidos, direta ou indiretamente.
Para as instituições de Justiça e os governos, as ações de reparação executadas nos últimos anos pela Fundação Renova, entidade criada com esse objetivo, foram insuficientes – mais de oito anos depois da tragédia, o reassentamento das pessoas que perderam suas casas ainda não foi concluído. Por isso, um novo acordo é discutido.
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